COMO SE MANIFESTA: APARELHO RESPIRATÓRIO

Foi confirmada a expressão do gene CFTR não só no epitélio respiratório desde as fossas nasais até aos bronquíolos mas também nas células serosas das glândulas submucosas. São as alterações resultantes da expressão da mutação da CFTR no pulmão, que ao nascer parece normal, que vão facilitar o crescimento de bactérias.

Para um funcionamento e uma limpeza adequada dos pulmões, existe uma pequena quantidade de fluido e muco ao longo das vias aéreas, que em conjunto com o movimento dos cílios (projecções tipo pêlos finos) das células da traqueia e dos brônquios, contribui para a remoção para fora das vias aéreas, de partículas inspiradas (poeiras, fumos, poluentes, bactérias, vírus, etc.) que de outra forma poderiam ser prejudiciais para a saúde.

Para que este movimento constante se mantenha, o muco das vias aéreas tem que ser fluido, pois caso seja viscoso haverá obstrução e a drenagem e limpeza das vias aéreas estará dificultada.

Nos doentes, o gene FQ anómalo dá uma informação errada para a síntese da proteína CFTR, que por isso não vai funcionar a nível da membrana apical das células epiteliais, como canal de cloreto.
Estas células vão ter assim dificuldade no transporte de sal e de água para dentro (absorção) e para fora (secreção), e em especial no transporte de iões cloreto.

Com efeito, no doente com FQ a CFTR anómala não consegue funcionar como canal de cloreto, ou seja, o canal de saída do cloreto para fora da célula, e que é dependente da CFTR, está bloqueado e como tal, o cloreto não consegue sair para o lúmen das vias aéreas arrastando consigo o sódio e a água.
Desta forma, ao ficarem retidos no interior da célula, passa a haver pouca água no fluido das vias aéreas, o que torna o muco mais desidratado e mais espesso.

Por outro lado, nos doentes com FQ, há uma hiperabsorção de sódio para dentro da célula (um excesso de entrada) e como atrás do sódio vem sempre a água, ao entrar mais sódio vindo do lúmen das vias aéreas para dentro da célula, arrastando consigo a água, mais desidratado fica o fluido das vias aéreas e mais espessas ainda ficam as secreções brônquicas, o que dificulta a drenagem, provoca obstrução e favorece a infecção.

QUE SINAIS? QUE SINTOMAS?
A maioria dos sintomas respiratórios são provocados pela obstrução dos brônquios com o muco mais espesso e viscoso que tem maior dificuldade em ser removido. Ao ficar retido nas vias respiratórias obstruindo-as, interfere com as trocas gasosas e com a remoção das bactérias que vão infectar o pulmão.
Além das infecções observa-se também, um processo inflamatório, que por sua vez aumenta a produção de muco, agravando mais a obstrução e consequentemente provocando mais infecção. Origina-se assim um ciclo vicioso difícil de quebrar que leva a lesão pulmonar irreversível.

Consequentemente surgem sintomas mais ou menos persistentes ou graves como:

  • tosse persistente;
  • expectoração espessa;
  • dificuldade respiratória.

As bactérias mais frequentemente isoladas nas secreções brônquicas na FQ são:

  • Staphilococcus aureus;
  • Haemophilus influenzae;
  • Pseudomonas aeruginosa;
  • Burkholderia cepacea.

As infecções respiratórias podem-se tornar evidentes logo nas primeiras semanas ou meses de vida, ou demorarem anos ou décadas, até que se tornem um problema evidente.
Sem tratamento adequado, a doença pulmonar vai-se agravando progressivamente. Com acompanhamento especializado, consegue-se controlar em parte a destruição pulmonar.
Com a evolução da doença surgem outros sinais e sintomas como:

  • hipoxémia (baixa de oxigénio no sangue);
  • dispneia (cansaço fácil com o esforço);
  • hemoptises (sangue na expectoração);
  • dor torácica aguda associada a dificuldade respiratória;
  • pneumotórax (colapso do pulmão por presença de ar no espaço pleural).

 

MANIFESTAÇÕES DAS VIAS RESPIRATÓRIAS ALTAS
A sinusite, comum na FQ, manifesta-se por:

  • obstrução e corrimento nasal;
  • dores de cabeça.

A polipose nasal surge frequentemente e manifesta-se por:

  • obstrução nasal, por vezes mais marcada só numa das narinas.

 

QUAL O TRATAMENTO?
Com a introdução dos antibióticos nos anos 40, o prognóstico destes doentes melhorou significativamente e a maior sobrevida actual, deve-se sem dúvida aos tratamentos que tem sido indicados nos últimos anos pelos Centros Especializados da doença.

O tratamento da doença pulmonar, baseia-se fundamentalmente na drenagem das secreções e no tratamento antibiótico. Apesar dos tratamentos, é muito difícil eliminar as bactérias que colonizam toda a árvore respiratória, incluindo os seios perinasais. Perante a infecção crónica estabelecida, com os antibióticos tenta-se limitar a destruição pulmonar, reduzindo a concentração de bactérias e o grau de inflamação.

Para que a administração dos antibióticos seja na altura correcta, médico, doente e familiares, devem estar atentos aos sintomas e sinais sugestivos de agravamento pulmonar. Sempre que o doente apresente três ou mais dos sintomas ou sinais referidos no Quadro I o médico deve ser contactado.

 

Quadro I – Sintomas e sinais associados a agudização pulmonar infecciosa

  • Aumento da frequência e duração da tosse | Aumento da frequência respiratória;
  • Aumento da produção de expectoração | Utilização dos músculos respiratórios acessórios;
  • Alterações na consistência e cor da expectoração | Diminuição da saturação de oxigénio;
  • Aumento da dificuldade respiratória | Alterações na auscultação pulmonar;
  • Diminuição da tolerância ao esforço | Declínio nas provas funcionais respiratórias;
  • Perda de apetite | Alterações na radiografia do tórax;
  • Febre e perda de peso.

 

A escolha dos antibióticos deve ter em conta os microorganismos isolados nas secreções brônquicas e a sensibilidade aos antibióticos.
Em caso de pneumotórax o tratamento implica internamento hospitalar para vigilância e se necessário colocação de tubo torácico de aspiração do ar, para expansão do pulmão.
Perante hemoptises deve o médico ser contactado para orientação dos cuidados a ter, nomeadamente com a cinesiterapia respiratória.

A polipose nasal pode melhorar com aplicação local de corticóides e em alguns casos está indicada a cirurgia.
A cinesioterapia respiratória, ou fisioterapia respiratória, é um dos componentes principais da abordagem terapêutica da FQ.
A cinesioterapia respiratória tem como finalidade a higiene brônquica, ou seja a limpeza das vias aéreas com mobilização das secreções brônquicas (muco, expectoração) e sua expulsão. Para tal os familiares e o doente devem estar sensibilizados e instruídos sobre as vantagens e as técnicas deste tipo de terapêutica.
São várias as técnicas que podem ser indicadas.

A escolha da técnica depende da idade, situação clínica, preferência do doente e experiência do Terapeuta ou familiar.
O número de sessões diárias são por regra duas e normalmente indica-se para:

  • idade inferior a 5 anos | Drenagem Postural com percussão e/ou vibrações e/ou compressõe;
  • entre os 5 – 10 anos | Drenagem Postural com Ciclo Activo da Respiração (ACTB);
  • idade superior a 10 anos | Drenagem Postural com ACBT, FLUTTER VPR1, PEP MASK.

 

Se durante a sessão ocorrer alguma complicação tal como:

  1. dificuldade respiratória,
  2. dor torácica,
  3. hemoptises
  4. tonturas,

deve suspender-se a sessão e contactar o médico.
Poderá ser necessário adaptar a técnica quando o doente tem um acesso venoso ou complicações como pneumotórax ou hemoptises.
Nos doentes com doença pulmonar mais arrastada em que a saturação do oxigénio tem valor baixo, a cinesioterapia deve ser efectuada com admnistração de oxigénio suplementar.

 

Para além das diferentes técnicas de drenagem e remoção das secreções brônquicas, os exercícios para controlo da respiração, a correcção postural, a boa forma geral, a actividade física global e as actividades lúdicas, nomeadamente desportivas devem ser encorajadas. Natação, remo, atletismo, ginástica, entre outras, auxiliam e completam a fisioterapia. A tolerância ao esforço deve ser controlada pelo paciente.

 

AEROSSÓIS

Frequentemente as sessões de cinesioterapia respiratória são complementadas com a inalação de fármacos através de aerossóis.
A inalação de medicamentos, ou seja a sua inspiração para o pulmão, pode ser feita através de diferentes sistemas que, para serem eficazes, têm que ser usados correctamente.
Na FQ frequentemente utilizamos para inalação os chamados sistemas pneumáticos, constituídos por um nebulizador (reservatório) e um compressor eléctrico (fonte geradora de gás). Com estes sistemas complexos fazem-se os broncodilatadores (ex. VentilanÒ solução respiratória, AtroventÒ solução respiratória; antibióticos ( TOBIÒ, ColomicynÒ) e mucolíticos (Pulmozyme Ò).

Da quantidade de aerossol gerada pelo nebulizador, só cerca de 10% vai ser depositada no pulmão. No caso de inalação ou de utilização do sistema incorrectas, a deposição do medicamento pode ser quase nula, não se conseguindo qualquer efeito terapêutico.
Por outro lado as secreções brônquicas espessas, que obstruem os brônquios, bloqueiam a entrada das partículas do aerossol e são responsáveis por uma diminuição da deposição dos medicamentos nestes doentes. Para ultrapassar este obstáculo deve-se drenar as secreções brônquicas o mais eficazmente possível.

Pode acontecer que a inalação do medicamento dado na forma de aerossol não seja bem tolerada. Referência a sensação de aperto torácico ou dificuldade respiratória com inalação sobretudo de antibióticos, pode contra indicar a continuação da medicação.
Sempre que surjam complicações ou dúvidas, deve contactar o seu médico para avaliação da situação.

 

Enquanto não chegam os novos medicamentos, é fundamental tratar os sintomas e as complicações de acordo om os tratamentos já existentes para mantes os pacientes em boa forma.